Nos dias de
hoje, não se acompanha mais o esporte sem as estatísticas de desempenho de
atletas e equipes. Contudo, quem começa a ler essas informações deve atentar
para o contexto em que elas são apresentadas. Analisar simplesmente os números
frios, pode ser uma forma inadequada de se avaliar a performance esportiva. Além
disso, nenhum dos fundamentos deve ser analisado sem estar atrelado aos outros.
Entenda que durante a partida um evento é influenciado pelo anterior, de modo
que um rebote (ofensivo ou defensivo) depende da forma como o arremesso foi
executado. Assim, ao valorizar um bom
número de rebotes ofensivos de sua equipe, lembre-se de que há
proporcionalmente um relativo número de arremessos errados.
Nos EUA há
muito tempo acredita-se no fenômeno da hot
hand, que parte do princípio de que a chance de se acertar um lance livre após
um acerto anterior é maior do que após um erro. Alguns estudos bastante
interessantes foram realizados (1-3) e suas análises contestando ou ratificando esta
teoria servem de bons exemplos para entendermos o quão complicado é acompanhar
a performance esportiva com base nas estatísticas do jogo.
A maior lição
que deve ser aprendida é o fato de que o scout
de um jogo ou a performance recente de uma equipe não têm poder de prever o que
pode vir a acontecer na partida seguinte. Em suma, a estatística explica o
passado, mas não prevê o futuro. Se fosse assim, ao invés de entrar em quadra
para disputar a bola, seria suficiente apresentar um card com as estatísticas da equipe na última temporada e comparar
com os dados do adversário, como num jogo bem popular de minha infância, o
Super Trunfo, que comparava carros de turismo, de fórmula 1, caminhões, motos,
lanchas, aviões e até balões, pelas suas descrições técnicas (cilindradas,
empuxo, velocidade máxima, etc). Vencia a disputa quem tivesse os valores mais
altos do item escolhido.
O uso da
estatística no esporte no Brasil ainda tem sido mal explorado e mal interpretado.
Há um pouco mais de 20 anos, surgiu uma proposta
de representação gráfica do desenvolvimento do jogo (4). No
exemplo abaixo, as equipes do Los Angeles Lakers e Seattle Supersonics faziam em
Seattle o jogo nº 6 dos play-offs da
Conferência Oeste da NBA em 1989. Pelo gráfico, pode-se notar que o time da
casa liderou o placar durante quase todo o tempo, perdendo a liderança apenas
nos últimos 6 minutos de jogo. A diferença entre as equipes chegou a ser de
confortáveis 28 pontos em favor do Sonics. Mas, se olhássemos as estatísticas
isoladamente, não teríamos condições de observar adequadamente o desenrolar do
jogo.
Vamos a outro
exemplo. Nos Jogos Olímpicos de Londres 2012, o encontro entre Espanha e
Grã-Bretanha terminou com estas estatísticas abaixo.
Espanha
|
Fundamento
|
Grã-Bretanha
|
49%
|
2 pts
|
49%
|
24%
|
3 pts
|
38%
|
66%
|
Lances Livres
|
69%
|
22
|
Assistências
|
12
|
15
|
Rebotes Ofensivos
|
10
|
28
|
Rebotes Defensivos
|
26
|
3
|
Roubadas
|
4
|
6
|
Tocos
|
1
|
13
|
Erros
|
13
|
0,88
|
Eficiência Ofensiva*
|
0,93
|
*pontos por posse
de bola
O placar do
jogo não foi apresentado aqui propositalmente. Se olharmos alguns dos dados
acima, poderemos concluir que a Grã-Bretanha saiu vencedora do confronto, ao
considerar os percentuais de aproveitamento de arremessos de quadra e lances
livres, o maior número de rebotes em disputa (indicativo de maior quantidade de arremessos errados pelo time visitante) no garrafão britânico (41 vs 38)
e, por fim, a maior eficiência ofensiva dos anfitriões. No entanto, a Espanha
teve 90 posses de bola (78 pontos) e a Grã-Bretanha teve apenas 84 (72 pontos),
ou seja, o placar final do jogo difere do que estas estatísticas acima nos
fazem acreditar.
Todo treinador
precisa ter seus jogos filmados para poder analisá-los não apenas sob o manto
descontextualizado das estatísticas, mas também sob uma ótica de análise de
jogo de forma mais completa, associando o scout
às variações da pontuação entre as equipes, ao ritmo de pontuação, assim como às
tomadas de decisão de seus atletas. E mais, não confie na memória! Filme o
jogo, assista-o fazendo anotações e depois acompanhe suas notas com os dados
descritivos do estatístico. Quanto mais informações você tiver, mais feedback terá a dar a seus atletas e
melhor será sua programação de treinos.
Referências
Referências
- Gilovich, T.; Vallone, R.;Tversky, A. The hot hand in basketball: on the misperception of random sequences. Cogn Psychol, v. 17, p.295-314, 1985.
- Wardrop, R.L. Simpson´s paradox and the hot hand in basketball. Amer Stat, v. 49, n.1, p. 24-8 , 1995.
- Yaari, G.; Eisenmann, S. The hot (invisible?) hand: can time sequence patterns of success/failure in sports be modeled as repeated random independent trials? PLoS One, v.6, n.10, p.1-10, 2011.
- Westfall, P.H. Graphical presentation of a basketball game. Amer Stat, v.44, n.4, p.305-7, 1990.
Muito bom o texto, é cesta! fiquei abismado em ver como esses dados da estatística do jogo entre espanha e grãbetanha induzem a uma vitória da segunda equipe.acho importante ressaltar para os leitores que, por ventura, não são do mundo do basquete que o time da casa na NBA é o último apresentado no placar; no exemplo a cima o SONICS. Lembro isso porque como não sou oriundo do basquete, por muito tempo, quando assistia os jogos da NBA, fiz confusão quando se referiam ao time da casa ou ao time visitante!
ResponderExcluirparabéns pelo texto!!
Oi, Marcos
ResponderExcluirBom texto, é importante entender que a estatística é uma feramenta de auxilio ao trabalho, ao planejamento e diagnósticos da situação com a finalidade de produzir correções e reforço para tomada de dicisões.
Assim a estatísitcas de uma partida de um determinado esporte serve para a propria equipe fazer avaliações do seu desempenho para futura correções, entender os pontos forte e fracos que precisam ser atacados.
MAIS NÃO É PARA DISPUTAS DE UM CAMPEONATO DE ESTATISTICAS
Um abraço
Ailton Oliveira