sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Brasília e o Jogo dos 1000 Erros


Esta semana houve a promoção de uma grande festa do basquetebol brasileiro. O NBB (Novo Basquete Brasil), competição organizada pela Liga Nacional de Basquete e que substituiu os campeonatos brasileiros de clubes outrora a cargo da Confederação Brasileira de Basketball, chegou à marca de 1000 jogos. A promoção foi bacana, com direito a vídeos em canais de mídia em locais públicos, como o metrô de São Paulo, por exemplo. O jogo não poderia ser outro se não aquele que colocava frente a frente os dois únicos campeões do certame em seus quatro anos de existência. Os times de Flamengo e Brasília com seus elencos repletos de estrelas dos basquetebol nacional foram contemplados com placas comemorativas antes da bola subir para o início da peleja. Muito bacanas e justas homenagens. Mas...

Durante o jogo a arbitragem foi confusa, o cronômetro de 24 segundos estava com defeito, o placar apagou durante e teve que ser reiniciado, as luzes do ginásio se desligaram parcialmente (fazendo um clima de “treino de segunda-feira a noite”, como disse Byra Bello durante a transmissão) e houve uma farta distribuição de faltas técnicas e desqualificantes (só no último quarto de jogo foram cobrados 39 lances livres!).

Esta equipe de arbitragem já teve dias melhores, é verdade. Houve atitudes provocadoras e certo exagero na intolerância às reclamações dos atletas. Ao que tudo indica, os árbitros foram instruídos a coibir qualquer reclamação acintosa. Concordo que o atleta brasileiro exagera nessas atitudes e que vive simulando faltas e “jurando por Deus que não encostou no adversário”, mas será que essa recomendação para a arbitragem chegou ao conhecimento das equipes? Em caso negativo, a arbitragem será meramente punitiva e levará mais tempo para modificar os hábitos dos jogadores. Mas...

Também não dá pra achar que somente os árbitros foram responsáveis pela confusão no jogo. Sei que muitos não vão concordar comigo, mas pelo que vejo, acho que o time de Brasília está “saturado de jogar junto”. O sempre eficiente trio Nezinho, Alex Garcia e Guilherme Giovannoni mostra sinais de cansaço emocional após cerca de uma década. As reclamações têm se tornado uma constante contra toda e qualquer arbitragem. Seus movimentos sempre buscam supervalorizar o contato dos adversários sugerindo marcação de falta a seu favor. E quando o árbitro considera o lance como normal, expressões verbais e corporais dramáticas são imediatamente executadas como forma de demonstrar seu descontentamento. Uma pena, pois o time é muito bom! Tão bom que é merecida e indiscutivelmente o tricampeão do NBB. Mas esse atual estilo de jogo tem tornado os jogos do Brasília chatos de se ver. E com isso se desconcentram do jogo e perdem o foco. Por duas vezes o Flamengo abriu 20 pontos de vantagem e o time candango fez a diferença baixar para 10. Nas duas vezes, suas reclamações (mesmo quando fundamentadas) deram ao rival a chance de cobrar sequências de lances livres que distanciaram as equipes no placar. Na primeira vez, inclusive, o time tinha acabado de sofrer uma falta antidesportiva, a 5ª do armador flamenguista Vitor Benite. Brasília teria dois lances livres com Arthur (o melhor em quadra) e mais a posse de bola, o que poderia deixar um saldo negativo de apenas seis pontos, reequilibrando o jogo. Mas...

Eu não entendi como ou por que (a TV não mostrou), mas o técnico do Brasília recebeu uma falta técnica e depois uma desqualificante. Ou seja, a falta antidesportiva do flamengo e a falta técnica do Brasília se anularam (em termos de penalidade), sobrando no fim das contas, dois lances livres e posse de bola para o Flamengo. Bem mais tarde, e novamente 10 pontos atrás, um ato impensado do armador Nezinho, gerou novas faltas técnicas e desqualificantes. E o Flamengo teve direito uma sequência de seis lances livres e posse de bola. Detalhe: foram tantas infrações sucessivas que a arbitragem ainda se confundiu nas contas e esqueceu de conceder outros dois arremessos ao time carioca (foram marcadas um falta pessoal, duas técnicas e uma desqualificante, total de oito lances). Some-se tudo isso às ausências dos pivôs Marcio Cipriano (lesionado) e Lucas Tischer (dispensado aparentemente por razões técnicas), que limitaram as opções táticas do treinador José Carlos Vidal.

O basquete brasiliense se tornou uma marca forte no esporte nacional e precisa continuar. Mas talvez seja interessante reformular o elenco para as próximas temporadas e evitar que alguns dos maiores atletas do basquetebol nacional tenham suas carreiras marcadas na reta final mais por reclamações do que cestas. Até por que, já vimos isso acontecer antes...

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

A Cesta de 15 Pontos


Na terça-feira, dia 04 de dezembro de 2012, houve um jogo fantástico válido pelo quadrangular final da Liga Sulamericana de Basquetebol. Em quadra estiveram Flamengo e Peñarol (da Argentina). O time brasileiro não fez um bom primeiro tempo e chegou ficar quase 6 minutos sem pontuar no segundo quarto. O estrago daquela primeira metade de jogo foi tão grande que durante 11 min e 38 s, o placar foi 31 a 5 para os argentinos (vejam a evolução do placar ao longo da partida na figura abaixo). Com uma diferença de 26 pontos dá pra se considerar a fatura liquidada. E o Flamengo foi para o vestiário 20 pontos atrás do adversário. E aí...bom, pra encurtar a estória, o Flamengo ganhou o jogo de 79 a 78. Mas como foi isso?


Já vimos viradas espetaculares acontecerem ao redor do mundo, inclusive com a Seleção Brasileira. Já mencionamos anteriormente a final dos Jogos Panamericanos de Indianápolis (1987), em que time brasileiro foi para o intervalo de jogo também com 20 pontos atrás, e virou a partida com base nos arremessos de 3 pontos. A conquista do Pan-1987 talvez tenha gerado a característica mais marcante do estilo de jogo brasileiro, o que muitos apelidaram de “chutebol”.

No entanto, diferentemente do que o basquetebol brasileiro está acostumado, desta vez não foram as milagrosas bolas de 3 pontos que salvaram o time. Pelo contrário, o aproveitamento do time nunca foi tão inexpressivo neste sentido: nenhum acerto em 15 tentativas! Cabe comentar que o Peñarol acertou 9 de 22 tentativas, equivalendo a bons 41% de aproveitamento nos arremessos de longa distância. O que fez o time carioca vencer, então?

Penso que três fatores contribuíram para a vitória. O primeiro foi o bom controle emocional da equipe (apesar de uma ou outra falta técnica!), a começar pelo estilo de liderança do técnico José Neto, que a todo tempo dizia para que seus atletas ignorassem os erros de arbitragem e se concentrassem no jogo. O segundo aspecto foi a atitude defensiva do time que passou a atrapalhar mais os arremessos argentinos e brigar de forma mais aguerrida nos rebotes (Olivinha e Shilton juntos pegaram 10 rebotes ofensivos!). Um rebote ofensivo dá à equipe atacante uma nova oportunidade de encestar sem que a posse de bola troque de mãos. Por fim, as inteligentes opções táticas do ataque, que tiraram o peso dos chutes de 3 pontos para se concentrar num jogo mais próximo à cesta. A figura abaixo mostra os arremessos do Flamengo no 4º quarto de partida. Observem que, ao invés de buscar a famosa "cesta de 15 pontos" para diminuir a diferença rapidamente, a maioria das finalizações ocorreu em até 1,5 m de distância da cesta, enquanto apenas 3 tentativas de longa distância foram efetuadas.


Será este o novo estilo do basquetebol brasileiro?
E você, acha que vale a pena tentar jogar mais perto da cesta e arremessar menos bolas de 3 pontos?




quarta-feira, 28 de novembro de 2012

A Polêmica das Bolas


Há poucas semanas li no twitter um comentário de um dirigente do E.C. Pinheiros acerca da preocupação por estar disputando três competições simultaneamente e que adotam diferentes marcas de bolas. Qual o problema disso? Na verdade, muitos! As três competições são o Campeonato Estadual Paulista (finais), Liga Sulamericana (fase semifinal) e o Novo Basquete Brasil (início da fase regular). As bolas são Pênalty (Campeonato Paulista), Molten (Liga Sulamericana) e Spalding (NBB). Pode parecer besteira, mas na verdade não é. A regra da FIBA não determina um único tamanho e peso da bola para a categoria adulto, por isso são permitidas variações de peso entre 567 g e 650 g, e circunferência entre 749 mm e 780 mm.

Estas diferenças parecem ser pequenas, mas de fato trazem modificações importantes na forma de segurar a bola e também na força aplicada para driblar (controlar), passar e principalmente arremessar a bola à cesta. Desconsiderar estas características é um equivoco que precisa ser evitado. Outra questão interessante é relativa ao material de confecção da bola. A textura do tecido que reveste a bola pode aumentar ou não o chamado grip, ou seja, a aderência da mão à bola. Temos um melhor controle com uma bola com menor circunferência e melhor grip, o que favorece os dribles e fintas, e os rebotes, por exemplo. Por outro lado, apesar dos arremessos de longa distância ficarem mais fáceis, o ajuste neuromuscular que deve ser feito pode comprometer a precisão. Vamos entender que quando treinamos de forma repetitiva um mesmo gesto motor, a tendência é que acabemos por determinar uma espécie de “memória motora inconsciente” (conhecido como engrama motor). Essa memória motora permite que façamos um movimento sem pensar, de forma automática.

Por exemplo, nos Jogos Panamericanos de Indianápolis em 1987, o treinador do time brasileiro, Prof. Ari Vidal, exigia que seus jogadores executassem após cada sessão de treino, 500 arremessos convertidos das suas posições convencionais de arremesso em quadra, em situação de jogo, inclusive marcado e em aro menor. Na final contra os EUA, os arremessos certeiros de Marcel de Souza e Oscar Schmidt foram o ponto de equilíbrio da equipe brasileira. O engrama motor estava tão bem estabelecido que as várias situações que surgiram ao longo da partida não ofereciam surpresas para os atletas. Contudo, este registro neuromotor pode ficar abalado se a cada vez que se treinar ou jogar for utilizada uma bola com dimensão e peso variados. Assim, é possível que o arremessador aplique força demais quando tentar um arremesso e a bola acerte sempre o fundo do aro, mas não a cesta perfeita, ou aplique força de menos e a bola nem alcance o aro.

Por fim, o material de confecção da bola pode apresentar variações no coeficiente de restituição, o que diretamente altera o controle da bola durante o drible e as fintas. Sucintamente, este coeficiente representa a modulação da velocidade do objeto (no caso, a bola) antes e depois de uma colisão com outro objeto (piso, por exemplo). Isso, claro, sem levar em consideração a calibragem da bola, mas que nada tem a ver com o fabricante.

Deste modo, penso que a preocupação do diretor do E.C. Pinheiros é pertinente. E merece atenção das autoridades ligadas ao comando administrativo do basquetebol.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

E Quando a Estrela Não Brilha?


Talvez com uma ou outra exceção, todas as equipes têm em seus elencos um ou dois jogadores considerados como as “estrelas” do time. São jogadores em quem o restante do time possui uma confiança tão grande que naqueles momentos de baixo desempenho geral e perda de controle emocional na partida a melhor opção é sempre passar a bola para eles. As chamadas estrelas agem como o porto seguro da equipe dentro da quadra. Apesar disso, sua principal característica não é necessariamente a liderança, mas sim a sua autoconfiança. São os jogadores cuja probabilidade de erro nos momentos decisivos é menor do que quando se compara com os demais companheiros de time. E tudo isso ocorre independentemente de faixa etária, gênero, e nível técnico das equipes. Sempre alguém joga melhor ou tem mais autoconfiança do que os outros dentro de uma equipe esportiva. O problema é “quando a estrela não brilha”, o que fazer?

Essa talvez seja uma das mais difíceis tomadas de decisão do técnico. Seu principal jogador não se encontra em um dia favorável, mas ao mesmo tempo, é o cara em quem todos confiam. Será que nestas condições é ele quem deve tentar a última cesta? E este arremesso final pode ser feito de qualquer maneira, mesmo desequilibrado, como se ele obtivesse uma espécie de “licença poética” para tentar o que quiser na quadra? Não existe uma ciência exata para se determinar o que fazer. Seja qual for a decisão do técnico, provavelmente ele será criticado se perder o jogo, e elogiado se vencer. É como dizem: “prognósticos, só no fim do jogo!”.

Essa situação surgiu ontem no jogo da NBA entre Oklahoma City Thunder e Los Angeles Clippers. O armador dos Clippers e seu principal jogador e líder, Chris Paul, fez possivelmente uma de suas piores apresentações em quadra na carreira. Seu aproveitamento nos arremessos de quadra não atingiu nem os 15% (2 acertos em 14 tentativas), além de 4 perdas de bola. Ainda assim, nos momentos finais da partida, foi dele a responsabilidade de buscar a vitória. Observem no vídeo abaixo que havia uma opção viável de passe (Matt Barnes na diagonal direita), mas Chris Paul optou pela jogada individual e fez o arremesso em total desequilíbrio corporal (giro e fade away) e desperdiçou a chance de vitória na casa do adversário. É bom ressaltar que qualquer cesta (de um, dois ou três pontos) definiria a partida em favor dos Clippers.







Um jogador amadurecido deve ter discernimento e sensibilidade suficientes para perceber qual é de fato a melhor opção tática a ser executada. Há uma linha tênue que separa os heróis dos vilões. Ao técnico, cabe da mesma forma decidir e orientar o plano de jogo que conduza a equipe ao êxito, sem transferir a responsabilidade a terceiros.

E se você fosse o técnico, o que faria?

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Os Times que Mudaram o Jogo


Acabei de ler o livro “Dream Team” do jornalista americano Jack McCallum. O livro apresenta como subtítulo “O time que mudou o jogo”. Obviamente, o livro versa sobre a seleção americana de basquetebol dos Jogos Olímpicos de Barcelona em 1992. A cada capítulo, um universo bastante diferente de informações é destacado, e em função disso, cabe perguntar: eram eles atletas ou artistas? O que faziam exatamente nos Jogos Olímpicos? Declarações da época indicavam que o torneio de verão seria tratado como férias olímpicas. E pelo visto, foi isso mesmo. Não havia preocupação com jogos ou adversários (exceto a Lituânia), nada de horários rígidos para dormir ou se levantar, nada de fiscalização sobre as atividades noturnas, sociais e etílicas do grupo. Os chamados “dreamers” jogaram muito mais pôquer e golfe do que basquetebol na Espanha. Ainda assim, os adversários não fizeram nem sombra, sendo invariavelmente derrotados por uma média superior aos 40 pontos de diferença, o que denota o imenso distanciamento do esporte profissional americano do resto do mundo à época.

A concepção de time dos sonhos pode ser interpretada de várias maneiras. Penso que a participação de alguns jogadores como Larry Bird, por exemplo, deveu-se mais ao conceito de time dos sonhos do que o mérito da época. Pra se ter uma ideia, ao ser perguntado sobre a possível aposentadoria após os Jogos, Bird respondeu “Já estou aposentado faz tempo; vocês é que ainda não perceberam!”. Ele não tinha condições físicas de jogar devido a uma lesão lombar crônica. Mas isso não importava. Não haveria um time dos sonhos sem Larry Bird no elenco. Na verdade, este time mais parecia a reunião dos Três Mosqueteiros (Magic Johnson, Larry Bird e Michael Jordan) e D’Artagnan (Charles Barkley). Pelo menos, assim eles se manifestavam.

A entrada dos profissionais da NBA mudou um tanto quanto a ótica (hipócrita) do Comitê Olímpico Internacional acerca do impedimento da participação de atletas profissionais. Vários atletas de diferentes modalidades já eram profissionais do esporte há tempos, mas não recebiam esta alcunha. A partir disso, muita coisa mudou no cenário esportivo internacional. Contudo, a ideia de que o Dream Team modificou o jogo é para mim apenas parcialmente verdadeira. Acredito que outros dois times anteriores a este foram os responsáveis iniciais pela grande mudança do esporte: Brasil (Jogos Panamericanos 1987) e URSS (Jogos Olímpicos 1988).

Os Jogos Panamericanos surgiram em 1951 e os EUA ganharam ouro nas primeiras cinco edições do torneio de basquetebol. A primeira vez que isso não aconteceu foi em 1971, em Cali, por conta de um desempenho abaixo do normal. Em sua campanha, os EUA venceram o Suriname por 80 pontos de diferença, e o Brasil na prorrogação (81 x 79), mas perderam para Cuba (69 x 73), sendo eliminados pelos critérios de desempate ainda na primeira fase da competição. O resultado foi tão fraco que apenas três jogadores foram mantidos na equipe que veio a perder a controversa final Olímpica em Munique no ano seguinte. Cabe destacar que apesar disso, 17 dos 21 atletas destas duas competições tornaram-se profissionais da NBA ou da ABA. O Brasil sagrou-se campeão naquele ano. As três edições seguintes dos Jogos foram voltaram a representar a hegemonia do basquetebol norte-americano, com mais três ouros conquistados. Até que chegamos em 1987, em Indianápolis, considerada na ocasião uma espécie de “Capital Mundial do Basquetebol”.

A final colocava frente a frente os donos da casa e a equipe brasileira, comandada pelo técnico Ary Vidal, um dos principais estrategistas do basquetebol brasileiro. Na volta do intervalo, o Brasil perdia por 15 pontos de diferença e dava clara impressão de que a situação já estava decidida. No segundo tempo, porém, os arremessos certeiros de Oscar Schmidt e Marcel de Souza reverteram o resultado e definiram o placar do jogo: EUA 115 x 120 Brasil. Essa foi a primeira vez que o basquetebol americano foi derrotado em seu próprio país.




Um ano depois, os Jogos Olímpicos de Seul (1988) marcaram o retorno das nações polarizadas pela guerra fria e parcialmente ausentes nos Jogos de Moscou (1980) e Los Angeles (1984). EUA e URSS se encontraram nas semifinais, e apesar de novamente contar com um elenco repleto de futuros astros da NBA, os EUA perderam a chance de brigar pelo ouro: URSS 82 x 76 EUA, e precisaram se contentar com o bronze. Este time soviético formou a base da equipe da Lituânia em 1992, e, por esta razão, foi a única equipe em Barcelona a ganhar pequenas doses de preocupação do técnico Chuck Daly e sua trupe dos sonhos.





Até então, a geração de David Robinson vinha sendo marcada pelo fracasso nas competições internacionais. Muito embora haja um desdém da crítica esportiva americana acerca da derrota de Indianápolis (isso é muito evidente no livro de McCallum), o fato é que esse foi o primeiro sinal de que mudanças eram necessárias. A derrota em Seul, por sua vez, deu tons claros aos criadores do basquetebol de que a modalidade já não estava mais sob seu domínio. Foram vencidos em 1987 por um time que jogou melhor, mas em 1988, foram vencidos por time efetivamente melhor! As reuniões entre Boris Stankovic (FIBA) e David Stern (NBA) não poderiam ocorrer em momento mais propício. Stankovic queria elevar o basquetebol internacional ao nível dos profissionais americanos; Stern queria aumentar a visibilidade (e garantir mais lucro) à NBA; e os EUA haviam perdido as duas últimas competições disputadas com seus atletas universitários.

Não vou me ater a falar aqui sobre o indiscutível impacto que o Dream Team causou no esporte como um todo (penso que não apenas no basquetebol), pois preferi dedicar este espaço para enaltecer outros responsáveis pelas mudanças ocorridas no basquetebol internacional e que não podem ser esquecidos pela história.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Como Utilizar as Estatísticas de Jogo


Nos dias de hoje, não se acompanha mais o esporte sem as estatísticas de desempenho de atletas e equipes. Contudo, quem começa a ler essas informações deve atentar para o contexto em que elas são apresentadas. Analisar simplesmente os números frios, pode ser uma forma inadequada de se avaliar a performance esportiva. Além disso, nenhum dos fundamentos deve ser analisado sem estar atrelado aos outros. Entenda que durante a partida um evento é influenciado pelo anterior, de modo que um rebote (ofensivo ou defensivo) depende da forma como o arremesso foi executado.  Assim, ao valorizar um bom número de rebotes ofensivos de sua equipe, lembre-se de que há proporcionalmente um relativo número de arremessos errados.

Nos EUA há muito tempo acredita-se no fenômeno da hot hand, que parte do princípio de que a chance de se acertar um lance livre após um acerto anterior é maior do que após um erro. Alguns estudos bastante interessantes foram realizados (1-3) e suas análises contestando ou ratificando esta teoria servem de bons exemplos para entendermos o quão complicado é acompanhar a performance esportiva com base nas estatísticas do jogo.

A maior lição que deve ser aprendida é o fato de que o scout de um jogo ou a performance recente de uma equipe não têm poder de prever o que pode vir a acontecer na partida seguinte. Em suma, a estatística explica o passado, mas não prevê o futuro. Se fosse assim, ao invés de entrar em quadra para disputar a bola, seria suficiente apresentar um card com as estatísticas da equipe na última temporada e comparar com os dados do adversário, como num jogo bem popular de minha infância, o Super Trunfo, que comparava carros de turismo, de fórmula 1, caminhões, motos, lanchas, aviões e até balões, pelas suas descrições técnicas (cilindradas, empuxo, velocidade máxima, etc). Vencia a disputa quem tivesse os valores mais altos do item escolhido.

O uso da estatística no esporte no Brasil ainda tem sido mal explorado e mal interpretado.  Há um pouco mais de 20 anos, surgiu uma proposta de representação gráfica do desenvolvimento do jogo  (4). No exemplo abaixo, as equipes do Los Angeles Lakers e Seattle Supersonics faziam em Seattle o jogo nº 6 dos play-offs da Conferência Oeste da NBA em 1989. Pelo gráfico, pode-se notar que o time da casa liderou o placar durante quase todo o tempo, perdendo a liderança apenas nos últimos 6 minutos de jogo. A diferença entre as equipes chegou a ser de confortáveis 28 pontos em favor do Sonics. Mas, se olhássemos as estatísticas isoladamente, não teríamos condições de observar adequadamente o desenrolar do jogo.  





Vamos a outro exemplo. Nos Jogos Olímpicos de Londres 2012, o encontro entre Espanha e Grã-Bretanha terminou com estas estatísticas abaixo.

Espanha
Fundamento
Grã-Bretanha
49%
2 pts
49%
24%
3 pts
38%
66%
Lances Livres
69%
22
Assistências
12
15
Rebotes Ofensivos
10
28
Rebotes Defensivos
26
3
Roubadas
4
6
Tocos
1
13
Erros
13
0,88
Eficiência Ofensiva*
0,93
                               *pontos por posse de bola

O placar do jogo não foi apresentado aqui propositalmente. Se olharmos alguns dos dados acima, poderemos concluir que a Grã-Bretanha saiu vencedora do confronto, ao considerar os percentuais de aproveitamento de arremessos de quadra e lances livres, o maior número de rebotes em disputa (indicativo de maior quantidade de arremessos errados pelo time visitante) no garrafão britânico (41 vs 38) e, por fim, a maior eficiência ofensiva dos anfitriões. No entanto, a Espanha teve 90 posses de bola (78 pontos) e a Grã-Bretanha teve apenas 84 (72 pontos), ou seja, o placar final do jogo difere do que estas estatísticas acima nos fazem acreditar.

Todo treinador precisa ter seus jogos filmados para poder analisá-los não apenas sob o manto descontextualizado das estatísticas, mas também sob uma ótica de análise de jogo de forma mais completa, associando o scout às variações da pontuação entre as equipes, ao ritmo de pontuação, assim como às tomadas de decisão de seus atletas. E mais, não confie na memória! Filme o jogo, assista-o fazendo anotações e depois acompanhe suas notas com os dados descritivos do estatístico. Quanto mais informações você tiver, mais feedback terá a dar a seus atletas e melhor será sua programação de treinos.


Referências

  1. Gilovich, T.; Vallone, R.;Tversky, A. The hot hand in basketball: on the misperception of random sequences. Cogn Psychol, v. 17, p.295-314, 1985.
  2. Wardrop, R.L. Simpson´s paradox and the hot hand in basketball. Amer Stat, v. 49, n.1, p. 24-8 , 1995.
  3. Yaari, G.; Eisenmann, S. The hot (invisible?) hand: can time sequence patterns of success/failure in sports be modeled as repeated random independent trials? PLoS One, v.6, n.10, p.1-10, 2011.
  4. Westfall, P.H. Graphical presentation of a basketball game. Amer Stat, v.44, n.4, p.305-7, 1990.


terça-feira, 14 de agosto de 2012

O Que Aprendemos Em Londres?


Passada a euforia das disputas nos Jogos, podemos agora fazer uma avaliação dos eventos ocorridos com a delegação brasileira em Londres, suas causas e consequências para 2016. Este ano tive a oportunidade de assistir os Jogos Olímpicos de uma forma diferente das outras vezes, consultando sistematicamente os comentários e opiniões postados no twitter, facebook e nos mais diversos blogs brasileiros. E pelo que li, permito-me ficar com a impressão de que ganhar uma medalha olímpica é fácil, muito fácil, tamanha foi a quantidade de críticas ao desempenho dos atletas brasileiros nas terras da rainha britânica. Terá sido essa nossa pior participação olímpica? Não, não foi. Tampouco mostramos evolução esportiva esperada em resposta ao investimento feito. Parece que daí é que surgem os grandes desdobramentos que vão alimentar os debates dos próximos quatro anos. Como devemos avaliar criticamente, sem ufanismos nem cornetagens, o desempenho do “Time Brasil” em Londres? Quais os caminhos para nos tornarmos uma potência olímpica? Quais são as barreiras ao desenvolvimento esportivo nacional? Nossos atletas amarelam? Estas perguntas serão debatidas ao longo deste e de outros textos que em breve estarão aqui no blog. Vamos começar...

O lendário lema dos Jogos Olímpicos “O importante não é vencer, mas competir!” parece ter sido interpretado de forma equivocada por tantos anos. O velho Barão de Coubertin certamente não ficaria satisfeito se seus esforços para reeditar o maior evento esportivo do planeta se resolvessem numa pura e simples participação nas provas. Duvido! Competir é disputar, é fazer o possível para conseguir o lugar mais alto do Olimpo. Ganhar ou perder são consequências de um aglomerado de circunstâncias que precisam atuar concomitantemente para que o sucesso seja possível. Por exemplo, o nadador Bruno Fratus saiu das piscinas sem medalha no peito, mas fez o melhor tempo de sua vida nos 50 m livre. No atletismo, a equipe de revezamento 4 x 100 m feminino bateu o recorde sulamericano da prova, mas não foi suficiente para a medalha olímpica. 
O handebol feminino também não passou das quartas de final, mas hoje, embora não esteja no mesmo nível, já pode ser vista com respeito pelas principais potências europeias da modalidade. Devemos considerar estes resultados como sucesso ou fracasso?

E estes outros: Maurren Maggi teve um ciclo olímpico irregular e intermediado por lesões repetidas e uma intervenção cirúrgica. Por essa razão, não se esperava medalha, mas nossa saltadora de ouro em Pequim fez falta na final do salto em distância, no mínimo para botar pressão nas adversárias. Fabiana Mürer era a mais forte candidata à medalha, visto seu retrospecto recente nos campeonatos mundiais do salto com vara. Não ganhou medalha. Não foi à final. Não tentou o último salto. Depois, saiu de lá como se tudo fosse absolutamente normal, como se tivesse desistido de tomar um cafezinho por não ter sua marca de adoçante preferida. E o glorioso futebol, esporte que se identifica com todas as camadas da população? 


O futebol, é bem verdade, merecia um capítulo à parte. Exagera quem diz que o Brasil tinha o seu principal time e os adversários não. Nosso time para 2014 não será aquele de Londres. Vai mudar goleiro, lateral direito, zaga, volantes, meias, e talvez até os atacantes. Ou seja, muita água vai rolar até a Copa. Este time nunca inspirou a plena confiança nem mesmo antes de aportar na Grã-Bretanha. Ainda assim, jogou contra adversários mais fracos e passou por dificuldades várias vezes. E aos olhos do mundo, não ganhou a prata, mas perdeu o ouro. É bem verdade que ninguém imagina que vai começar o jogo com 1 x 0 para o adversário (gol aos 29 segundos de jogo!). 
Mas para um esporte que tem um milionário orçamento anual (o mais alto entre todas as modalidades) e que está para o Brasil assim como o basquetebol está para os EUA, este interminável jejum de ouro olímpico envergonha até o torcedor mais ufanista do país! Só pra se ter uma noção, o basquete norte-americano tem 21 ouros (14 masculinos e 7 femininos), enquanto nosso futebol tem zero! Pra onde vai o planejamento e o investimento de tantos anos?


Em minha opinião, atleta olímpico não tem obrigação de ganhar medalhas, mas deve ter o mais intenso desejo de conquistá-la! E quando você deseja algo de verdade, faz o possível para conquistá-lo. E numa hora como essa me lembro do ensinamento do maior de todos os treinadores de basquetebol da história, John Wooden: “Sucesso é a paz de espírito proveniente da consciência de que você fez todo o esforço possível para se tornar o melhor dentro do seu potencial”.

Por falar nisso, e o basquete? Bom, o masculino disse a que veio. Penso que muitos ainda não dimensionaram o que representou a simples classificação para Londres. Vejam, se a classificação não fosse efetivada, o basquete brasileiro perderia não apenas mais 4 anos, mas sim 8 anos para se reerguer, pois a vaga para Rio 2016 é automática e entraríamos desacreditados, como se tivéssemos penetrado na festa pela entrada dos garçons. Precisávamos ganhar a vaga na quadra, jogando, e não burocraticamente por ser o país sede. Precisávamos merecer nosso lugar no torneio olímpico. E depois de três ciclos olímpicos de fora (não gosto da conta de “16 anos fora” para um evento que só ocorre de 4 em 4 anos!), voltamos.
O grande mestre Prof. Wlamir Marques fez (em minha opinião) o mais lúcido e atento comentário sobre a equipe brasileira nos Jogos ao ressaltar que não fomos a Londres para ganhar medalha, e sim para resgatar a imagem do basquetebol brasileiro no cenário internacional. Visão de quem já ostentou no pescoço duas medalhas olímpicas e dois títulos mundiais! Então, professor, missão cumprida! Poderia ter sido melhor? Claro, sempre pode ser melhor. Entretanto, a base do trabalho para a próxima vez está consolidada e creio que os frutos devem ser colhidos ao longo dos próximos dois ciclos olímpicos. Por outro lado, o feminino saiu daqui desacreditado, chegou lá desmembrado, e voltou pra casa derrotado. Temos um problema que parece de difícil solução em curto prazo: não temos adversários na América do Sul! Isso mascara sobremaneira as limitações de nossos times. Precisamos de uma Liga Sulamericana de clubes forte, precisamos de intercâmbio com países europeus. E precisamos que a Liga de Basquete Feminino decole! E isso é só ponta do iceberg.

O que está abaixo da linha d’água, a parte submersa do iceberg, é o maior de todos os problemas. Mas ao mesmo tempo, penso que não seja. Vou dar o exemplo de duas modalidades cujas Confederações parecem ter encontrado soluções para enfrentar os desafios do desenvolvimento esportivo. O judô levou 14 atletas a Londres, colocou 11 deles entre os oito melhores do mundo e ainda se fez presente em quatro pódios. O vôlei (quadra + praia) disputava seis medalhas, ganhou quatro, e mais, continua a manter-se entre os seis primeiros do mundo desde de 1980 no masculino e de 1988 no feminino. Foram 11 medalhas somente nas últimas três edições de Jogos Olímpicos, sendo quatro ouros. Para agravar a situação, o vôlei de quadra é a única modalidade coletiva brasileira a ouvir o hino nacional nos Jogos Olímpicos! Foram quatro títulos de campeão olímpico desde 1992 em Barcelona. E até agora, ninguém mais repetiu o feito. Na praia, que é olímpica desde 1996, o Brasil nunca deixou de marcar presença nas cerimônias de premiação. O que me deixa incomodado é que o vôlei em tese tem as mesmas dificuldades e limitações operacionais que o basquete (inclusive a disputa de público com o futebol). Mas como o vôlei conseguiu atingir e permanecer na elite mundial do esporte e o basquete não?

Já comentei outras vezes aqui no É Cesta! que a formação dos dirigentes esportivos é um fator fundamental para o crescimento esportivo do país no longo prazo. O vôlei e o judô entenderam isso faz muito tempo, mas parece que as demais modalidades ficaram vendo o bonde passar e não aproveitaram as mesmas oportunidades. A Confederação Brasileira de Voleibol tem um centro de treinamento especializado e bem estruturado, cursos de capacitação de professores e treinadores em todo o país, planejamento comercial (marketing) eficiente, e de forma mais ousada, a recém-criada Universidade Corporativa do Voleibol, que pretende formar profissionais para as mais variadas funções associadas à excelência da performance da modalidade no país.

O que aprendemos em Londres é que o caminho para o desenvolvimento do basquetebol e do esporte brasileiro em geral estava logo aqui ao lado e o tempo todo, mas ninguém se tocou! 

O pior cego é aquele que não quer ver...

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Muito Longe de Londres ou Rio de Janeiro


O esporte brasileiro está prestes a mostrar ao mundo seu valor. Logo após o fim da epopeia londrina, precisamos focar em definitivo nos megaeventos esportivos que vamos organizar ao longo do próximo ciclo olímpico. Enquanto esperamos a conquista de medalhas e performances expressivas em Londres (2012) e no Rio de Janeiro (2016), existe um outro lado do esporte brasileiro que não aparece na mídia esportiva nacional. Uma realidade bem diferente e incoerente com as intenções de trazer os Jogos Olímpicos e Paralímpicos para nossas terras a fim de, entre outras coisas, fomentar a prática do esporte em todas as suas dimensões (sócio-educativa, lazer ativo, promoção de saúde e qualidade de vida, alto rendimento e entretenimento popular). Quando nos afastamos dos grandes centros do país, o que observamos é a total disparidade entre as honrosas conquistas e demonstrações de superação de nossos atletas olímpicos e paralímpicos e aquilo que se propõe e que se pratica nas demais regiões.

Vou dar o exemplo do basquetebol sergipano. Quando cheguei aqui em Aracaju, em 2006, para ser professor da Universidade Federal de Sergipe, não tinha planos de voltar a trabalhar com esporte. Mas, no ano de 2008, exatamente uma década afastado da modalidade, me deparei com a inevitável situação de assumir a disciplina Metodologia do Basquetebol na UFS. Paralelamente, resolvi aceitar o convite de alguns alunos e assumi a direção da equipe universitária de basquetebol. De início, a ideia era apenas a participação nos Jogos Universitários Brasileiros, mas logo veio o interesse de participar de outras competições, como o Campeonato Estadual Adulto.

No dia da estreia no Estadual, me senti constrangido quando o árbitro principal da partida veio a mim e solicitou o pagamento da taxa de arbitragem antes que a partida se iniciasse. O pagamento era feito ali na quadra, na frente de todo mundo. Parecia que estávamos pagando propina aos árbitros! Durante os anos em que fui atleta e técnico no Rio de Janeiro, nunca passei por situação similar. As taxas de arbitragem eram pagas ao final do mês pelo clube, contabilizando o número de partidas disputadas em cada faixa etária e em função das categorias dos árbitros.

Mas aqui em Sergipe não existem clubes participando dos campeonatos, e quem faz o esporte de base são as escolas. Algumas delas...aliás, somente quatro escolas participaram dos campeonatos estaduais de base este ano. A Federação Sergipana de Basketball (FSB) tem apenas três filiados, sendo uma escola e dois clubes, mas estes clubes não oferecem o basquetebol em sua grade de atividades aos sócios. Em um deles inclusive, o teto do ginásio desabou em 2006 e nunca mais foi restaurado. É difícil administrar o esporte se a Federação não tem arrecadação. E em função da ausência dos clubes, para organizar a tabela do campeonato, a FSB precisa contar com a nem sempre possível disponibilidade de quadras em escolas, no Sesc/Sesi ou no Ginásio Estadual (enorme e sempre vazio para nosso público). Os jogos acontecem em rodada única, todos na mesma quadra. Não temos jogos ocorrendo concomitantemente em vários ginásios. Isso afeta até o número de árbitros no quadro da Federação. Não adianta ter árbitros demais se os jogos são raros.

Apesar da FSB ser a única federação esportiva aqui no Estado com toda sua documentação em dia (mérito do atual presidente, um especialista em contabilidade), a captação de recursos via patrocinadores tem se tornado escassa. Assim, se não há recursos, não há como haver muitos jogos. Vejam só a situação:

Campeonato Estadual Sergipano 2012
Categoria
Equipes Participantes
Total de Jogos Previstos
Partidas Disputadas pelo Campeão
Sub-15 Feminina
2
Melhor de 5 partidas
3
Sub-17 Feminina
3
3
2
Sub-15 Masculina
6
10*
4
Sub-17 Masculina
5
10**
4
          *Um dos jogos foi WO;
**Houve um WO e por isso outras duas partidas não foram realizadas.

Pois é. Além de não termos campeonatos sub-13 e sub-19, a quantidade de jogos disputados pelos nossos times é absurdamente baixo. Claro que não é só isso. As equipes também disputam jogos escolares (pelo menos três outras competições no ano), mas em geral com adversários muito inferiores e com regulamento adaptado por razões financeiras (tempo de jogo de quatro períodos de 8 minutos corridos, por exemplo). Fica complicado fazer com que nossos técnicos, atletas e árbitros se desenvolvam adequadamente com esta situação.

Em relação à categoria sub-19, as escolas só jogam até a sub-17, e como não temos clubes, quando o atleta chega aos 18 anos, não tem mais onde jogar. No campeonato adulto, nenhum clube oficial participa. Eventualmente alguma escola resolve participar, às vezes com atletas demasiadamente jovens para este tipo de torneio. Os times são criados entre amigos que pagam do próprio bolso a confecção dos uniformes e a taxa de inscrição no campeonato, e ainda por cima, a FSB condiciona a participação da equipe à presença de um técnico. Ou seja, os raros que se habilitam à função, têm que trabalhar de graça, pois não há perspectiva de receber salário.

Há pouco tempo atrás, pensei em criar um projeto de extensão na UFS para viabilizar a detecção de talentos esportivos. Mas, se encontrar um jovem com potencial esportivo interessante, vou encaminhá-lo para onde se não temos clubes? Acho que o papel do esporte escolar é meramente a detecção de talentos, não sua promoção ou desenvolvimento. E não creio que possamos desenvolver talentos fazendo uma meia dúzia de jogos ao ano.

O pior de tudo é saber que esta realidade não é exclusividade nem do basquetebol e nem mesmo do Estado de Sergipe. Esse foi só um exemplo para mostrar a cruel realidade que o país dos próximos Jogos Olímpicos terá que enfrentar.

Se você passa por situação semelhante, comente aí embaixo!

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Nosso Basquete Feminino

O basquete feminino brasileiro já viveu seu momento de maior expressão da modalidade no mundo. Durante uma década inteira, os corações basqueteiros daqui se orgulharam das conquistas do Panamericano de Havana (1991), o Campeonato Mundial na Austrália (1994), e das medalhas de prata nos Jogos Olímpicos de Atlanta (1996), e bronze em Sidney (2000).
 
 
 
Infelizmente, com a virada do milênio, parece que o esporte brasileiro perdeu seu brilho e seu status. Apesar das constantes participações nos torneios olímpicos, nunca mais alcançamos o pódio nas principais competições do mundo. O que tem acontecido?
 
Sabemos que o esporte feminino não obtém a mesma oportunidade na mídia esportiva, e isso não é só no Brasil. A cobertura da imprensa para os jogos femininos da NCAA ou da WNBA, assim como de nossa ainda jovem Liga de Basquete Feminino (LBF), é muito modesta. De que maneira isso reflete sobre a qualidade do trabalho desempenhado nas quadras? Penso que muito. A CBB passou por mudanças administrativas que ainda não surtiram os efeitos desejados e que podem fazer o hino nacional ser ouvido novamente na cerimônia de premiação dos Jogos Olímpicos. Não conheço profundamente o trabalho do atual técnico, Luís Cláudio Tarallo, apenas vi seu currículo mais recente no site da própria CBB, e fica óbvio que lhe falta experiência. Mas esta experiência só se adquire com o tempo e as responsabilidades de tomar decisões.
  
Não gostei do fato da seleção feminina ter tido um grande rodízio de treinadores durante este ciclo olímpico, pois isto impede a determinação de uma filosofia de trabalho e padrão de jogo no longo prazo. Estas coisas não se resolvem do dia para a noite, portanto o técnico precisa de tempo para trabalhar. Faz parte de seu trabalho assistir aos jogos e competições, receber e interpretar as informações de atletas que jogam no exterior, acompanhar as divisões de base para que se possam identificar aquelas atletas que podem fazer parte da seleção alguns anos depois. Preparação olímpica ocorre constantemente, não apenas próximo à competição.

Vi numa entrevista da diretora do basquete feminino da CBB, a ex-atleta Hortência Marcari, que a intenção da instituição é dar vivência neste tipo de competição ao treinador Tarallo, para que em 2016 ele esteja em plenas condições de obter resultados mais expressivos. Temos que analisar isso de duas formas diferentes. Uma é que este é o início de um novo processo, de renovação da estrutura do basquete feminino brasileiro, e que diante do atual quadro, acertadamente estamos sacrificando os Jogos de Londres 2012 para nos prepararmos de fato para o ciclo seguinte. Correto. A outra análise é por que deixamos escapar o que tínhamos de concreto nos anos 1990? Será que um título mundial e duas medalhas olímpicas não eram suficientes para mobilizar variados projetos de iniciação esportiva, em especial entre meninas, no basquetebol brasileiro? Por que o esporte brasileiro é tão dependente de “momentos extraordinários” ou “gerações espontâneas de atletas” e não baseado em uma linha de trabalho que permita continuidade?
 
O curioso é que na América do Sul, ainda não temos adversárias. Mesmo países com contínuos trabalhos de qualidade no masculino, como Argentina, República Dominicana, Porto Rico ou Venezuela, não conseguem montar equipes femininas que exijam da seleção brasileira um esforço diferenciado para vencer as partidas. Urge a necessidade do Ministério do Esporte, do Comitê Olímpico Brasileiro, da Confederação Brasileira de Basketball e da Escola Nacional de Treinadores de Basquetebol trabalharem em conjunto para que sejam traçados os planos para o futuro do basquete feminino no Brasil. Acho que o mundo da bola laranja espera isso de nós.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

A Formação de Técnicos Desportivos no Brasil


Em breve fecharemos um ciclo de 10 anos de realização de eventos esportivos de grande porte em nossas terras. Desde 2007, quando foram celebrados os Jogos Panamericanos e Parapanamericanos do Rio de Janeiro, recebemos a incumbência de sediar Jogos Mundiais Militares, Copa das Confederações, Copa do Mundo, Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Com tanto investimento público e privado, seria bastante natural que as críticas enfatizassem a questão do legado que fica para a cidade- ou país-sede, e uma das dimensões debatidas é o legado esportivo. Em relação a isso, não podemos nos limitar a pensar sobre o que fica depois dos Jogos, mas sim sobre aquilo que é feito antes dos Jogos.

Neste sentido, muito tem sido comentado sobre a formação dos atletas em nosso país (independentemente de modalidade), e a preparação de nossas equipes para disputar os não tão distantes Jogos Olímpicos de 2016. Na época da 2ª Guerra Mundial, Winston Churchill expressava que quem falha ao se preparar, prepara-se para falhar. Entende-se, portanto, que o planejamento é a base de tudo. Esta etapa precisa ser alimentada pela experiência dos envolvidos e pela interpretação dos dados coletados ao longo de anos, sempre alicerçados por um instinto visionário e estrategista. Já debatemos aqui no blog sobre a importância da formação de árbitros e dirigentes, que são elementos essenciais para o desenvolvimento do esporte, mas precisamos também nos debruçar sobre a formação dos formadores de atletas, em todos os níveis e etapas do processo.

Mas onde devem se formar os treinadores esportivos? Parece que a resposta é simples, mas de fato não é. As faculdades da educação física em boa parte do país sofreram modificações em seus currículos e projetos pedagógicos que acabaram por desvalorizar uma formação mais específica de seus egressos, partindo para algo mais generalista e superficial. Hoje posso afirmar que, salvo raras e louváveis exceções, nenhum técnico esportivo é formado pura e simplesmente nos nossos cursos. Se ao menos uma base teórica for estabelecida no âmbito da vida acadêmica universitária, cursos complementares tornar-se-ão o caminho obrigatório para o encerramento de sua formação. A Escola Nacional de Treinadores de Basquetebol (ENTB) foi uma boa iniciativa. Não se iludam, pois ela não resolverá por definitivo os problemas do nosso esporte, mas certamente ajudará (e muito!) a darmos um passo mais consolidado nesta perspectiva.

É necessário que haja núcleos da ENTB em cada Estado viabilizando um acesso mais estreito à informação, com grupos de debates e apresentações de trabalhos, de modo a fazer com que os reais problemas e dificuldades enfrentadas pelos atuais treinadores venham à tona e que as possíveis soluções surjam com mais embasamento. A regionalização dos problemas e das soluções deve ser respeitada para que ninguém pense que a ideia que deu certo em São Paulo, Brasília ou Rio de janeiro, vai funcionar perfeitamente em Sergipe, Alagoas ou Rondônia.

A formação dos formadores de atletas precisa ser a prioridade nesta etapa do processo, se não vamos continuar nacionalizando estrangeiros para cobrir as lacunas deixadas por nossas próprias falhas. No entanto, duas palavrinhas têm de estar na ordem do dia: planejamento e paciência. Pra que tudo isso dê certo, temos que esperar o momento certo para cobrar os resultados. E convenhamos, paciência nunca foi uma característica do esporte brasileiro...


                                                    “Se você quer ter resultados diferentes no futuro,
                                                     tem que começar a fazer coisas diferentes agora!” 
                                                                                    (Paulo Emannuel da Hora Matta)

sábado, 30 de junho de 2012

Ser Campeão Hoje ou no Futuro?


Por Luiz Eduardo M. Gois Jr

Como já foi dito no texto "Progressão Pedagógica no Basquetebol" o basquete dever ser ensinado respeitando as faixas etárias dos alunos, apresentando novos elementos a cada ano e tornando o aprendizado cumulativo. Em outro texto, “E Agora o Que Eu Faço”, comentamos que o jogador de basquetebol é obrigado a tomar decisões em curto espaço de tempo. Portanto ensinar o “por que fazer” deve fazer parte do conteúdo programático de ensino do basquete desde primeiras fases de aprendizagem e deve ser mais importante do que simplesmente ensinar o “como fazer”.

Em alguns Estados brasileiros os clubes não participam do processo de formação de atletas e equipes, cuja responsabilidade passa a ser exclusivamente das escolas. Nestas praças os campeonatos escolares têm relativamente bom espaço na mídia, o que acaba tornando-os um meio de fazer propaganda das escolas. E para isso, os resultados expressos na forma de títulos e medalhas, são os principais objetivos das escolas e consequentemente dos professores. Essa busca por este tipo de resultado nas divisões de base gera problemas que deveriam ser evitados. Essa pressão por resultados faz com que os professores queimem etapas e às vezes utilizem abordagens metodológicas que não são adequadas para determinadas etapas de ensino da modalidade.

E quais são as metodologias usadas no ensino dos esportes? Existem duas principais, a metodologia tradicional, que é aquela que se preocupa com o ensino dos fundamentos fora do contexto do jogo, ou seja, apenas pela repetição do gesto. Exemplo, o ensino do passe utilizando duas colunas uma de frente para o outro passando a bola, excluindo um dos elementos principais da modalidade que é a oposição, o que vai acabar omitindo também as tomadas de decisão, as percepções das diferentes situações, etc.

Nessa metodologia é ensinado ao aluno apenas o “como fazer” e deixando de lado o entendimento do jogo, o “por que fazer”. Que pode ser ensinado utilizando a metodologia situacional, que tem como característica principal a utilização de situações de jogo. Exemplo, jogos de 1x1, 2x2, 3x3, nesse caso não existe a exclusão da oposição, além disso, vai estimular a capacidade de percepção e de tomar decisões dos jogadores. Fazendo uma analogia ao cotidiano, na metodologia tradicional o professor leva o aluno para um restaurante e determina qual o prato que ele tem que comer, já a situacional o professor mostra o cardápio para o aluno escolher o melhor prato. Ele pode até escolher errado e não vai gostar do prato, mas na próxima vez ele saberá que aquela opção não é a melhor e vai saber por que escolher um prato diferente.

O que acontece quando o principal objetivo do professor é ser campeão e não formar jogadores eles acabam utilizando apenas a metodologia tradicional, principalmente porque o resultado acontece mais rapidamente. Quando o professor está preocupado em formar um jogador ele utiliza as situações de jogo, trabalhando o entendimento da modalidade com seus alunos. A “desvantagem” desse método é o que o resultado só vem a longo prazo, o processo nessa metodologia é mais demorado e muitos professores não tem paciência para utilizá-lo.

Portanto, nas etapas de formação de atletas, é importante que os professores tenham uma visão a longo prazo e pensem na formação do jogador para que ele possa ser campeão no futuro e não apenas campeão mirim dos jogos escolares do ano corrente. E para isso dê ao aluno um cardápio para ele escolher o prato e não diga apenas o prato que ele deve comer.

O Dirigente Esportivo no Esporte de Base


Li num site de rede social esta semana uma denúncia/reclamação de uma pessoa que relatava ter seus atletas de categorias de base (e seus pais!) sendo assediados por um diretor de outro clube. No relato, havia promessas de ganhar camisas do clube e outras formas de brindes numa tentativa de seduzir os jovens atletas (todos menores de idade) e seus pais para se transferir para o novo clube.

Os comentários publicados logo abaixo do relato mostraram clara indignação dos leitores em relação ao gesto atribuído ao diretor. Infelizmente, esta é uma prática antiga, que pelo visto, ainda não entrou em desuso. Já escrevemos um texto recente acerca da formação e da atuação do dirigente esportivo, mas é certo que o assunto não se esgotou. Há uma premissa básica na formação de atletas que postula que “da quantidade extraímos a qualidade”. Assim, precisamos da massificação da prática esportiva para que possamos identificar e selecionar os talentos esportivos. Qual o passo seguinte?

Existem muitos professores e treinadores da base que, apesar de condições precárias e de baixos salários, executam trabalhos condizentes com sua paixão pelo basquetebol. Em clubes de baixo investimento estes treinadores chegam a trabalhar de graça. Depois de meses ou anos de dedicação, quando finalmente conseguem obter uma geração de atletas promissores, podendo fazer com que o clube de baixo investimento tenha chances de jogar quase em igualdade de condições com os clubes de alto investimento, surgem os convites destes últimos, desmontando time original. O resultado dessa iniciativa é o fim das atividades daqueles clubes.

Há uma decisão a ser tomada que parece simples, mas de fato não é. O que fazer com estes atletas iniciantes: deixá-los no clube original ou transferi-los para um clube maior? Vamos aos argumentos de cada lado. Deixar no clube original permite a continuidade do trabalho da instituição e visa à possibilidade de se descobrir outros talentos da modalidade, em função de haver mais um espaço disponível para a prática. Isso também tende a diminuir a diferença da qualidade de jogo entre os clubes de diferentes níveis de investimento. Por outro lado, há quem defenda a ideia de que o atleta pode vir a se desenvolver de forma mais consolidada se inserido numa estrutura mais abrangente. Neste contexto, os dois lados têm razão. Mas quem deve tomar a decisão?

Em nossa opinião, esta deveria ser uma decisão pautada no debate entre treinadores e não diretores. Vi diretores de categorias de base atuarem no sentido de enfraquecer seus rivais, sem se preocupar com o desenvolvimento do esporte. Em outras épocas, havia times sub-13 ou sub-15 no Rio de Janeiro que detinham todos os armadores de boa qualidade do Estado, não deixando nenhum para os adversários. O problema é que não há vaga para todos jogarem num mesmo time. Assim, o tal desenvolvimento a partir de uma estrutura melhor não acontecia, pois o atleta nem entrava em quadra. Melhor seria obter a experiência de jogo enfrentando as adversidades do próprio jogo na prática, mesmo num clube menos estruturado.

A responsabilidade do diretor de categorias de base não pode ser apenas com os títulos e medalhas de próprio clube, mas deve focar metas de desenvolvimento do esporte como um todo. Se não há adversários de qualidade, não há meios de fazer seu time melhorar. Este é um dos mais básicos princípios do treinamento desportivo: sobrecarga e adaptação. Seu time precisa enfrentar adversários de mesmo nível de jogo ou algo melhor (sobrecarga) para que possa melhorar suas habilidades atléticas, físicas, técnico-táticas, psicológicas e cognitivas (adaptação). Volto a insistir, o dirigente esportivo não pode ser simplesmente um ex-atleta ou pai apaixonado pelo esporte. Tem que ter formação específica para exercer ética e eficientemente sua função.